Olhei os seus dedos finos, delicados como tesouros. O
frasco de boca larga ampliou a beleza da pele branca. Vi nela um delta de veias
que desaguou no meu coração – como foi inquietante! Quando se sentou no chão, não podia imaginar que, naquela
tarde, tudo mudou no meu olhar. O que era incolor deixou passar a luz, o que
era invisível transformou-se na porta das insónias.
Escrever a peça de teatro
ganhou outros sentidos. A Bruna passou a ser a flor que eu não tinha. E tinha
muitas. Cuidava delas todos os dias antes do sol desaparecer no horizonte. Sempre
gostei de flores e de paisagens. O problema é que apenas eu via flores nesses
lugares. Às vezes, descia a rua, para apanhar o autocarro, em frente à paragem
havia um canteiro com uma palmeira ao centro. Na Primavera era possível sentir
o cheiro, principalmente, ao fim da tarde.
Enquanto esperava, as pessoas faziam
conversa de circunstância, iam falando do tempo, das doenças e dos filhos;
apesar da paragem ter um banco para três pessoas, muitas velhinhas preferiam
sentar-se no muro branco de barra azul. Em dias de sol preferem sempre a sombra
da palmeira. Quando o autocarro se aproxima rapidamente agarram os sacos e
encaminham-se para a porta sem perder o fio da conversa.
É uma espécie de
tertúlia de bairro com hora combinada. Ali na rua todos se conhecem pelo nome.
A menina Alice, é assim que lhe chamam, é a mais rija, está reformada e costuma
ir visitar a irmã que mora no outro lado do rio. Leva laranjas e maçãs da sua
horta e um galo com as patas atadas.
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