Escrever
é, talvez, uma das maiores paciências, é uma busca onde se conjuga a palavra e
o sonho. Ao longo de muitas tardes, reuníamos na casa do Daniel, da Bruna, do
Santiago ou na minha. A Árvore que não quer ficar parada crescia
lentamente. O título era arrebatador, sentíamos as raízes dessa árvore e com
ela, também, a Leonor. Éramos levados pelas palavras e, talvez, pela força
invisível das árvores que procuram a luz.
Lá em
casa não havia caramelos, nem bolachas de água-e-sal, apenas bolinhos secos,
num frasco de rolha larga onde cabia a nossa mão. Foi aí que reparei nos seus
dedos. Num instante pareceu-me que a sua mão estava num museu, acessível apenas
ao olhar. Antes de continuarmos a escrever, foi ao armário, trouxe rebuçados e
sentou-se no chão. Lá fora a passarada aninhava-se nas árvores do jardim, os
seus cantos misturavam-se como instrumentos de uma orquestra.
Era tempo de ditar
o meu parágrafo. O toque da campainha interrompeu-nos. Fiquei agarrado à frase
como uma lua de papel ao vento. Inesperadamente, senti que a frase naufragou no
oceano onde os cardumes gostam de saborear a chegada de novos mundos. Por
instantes, sentimo-nos peixes, queríamos continuar, havia uma promessa em cada
sílaba, um perfume indizível que se espalhava quando a voz retomava a frase
interrompida:
António Vilhena